25.4 C
Brasília
quinta-feira, 28 março, 2024

A querela saudita-iraniana: Outra escaramuça na guerra do petróleo

por Pepe Escobar

A Arábia Saudita é o paraíso da decapitação. Mas este pesadelo de relações públicas é o menor de todos os problemas numa crise petrolífera. Mais uma vez, o cerne do assunto é – o que mais poderia ser – o ouro negro.

Até agora, toda a estratégia energética da Casa de Saud reduziu-se a cortar a sua produção petrolífera aconteça o que acontecer, até mesmo emitindo títulos [de dívida pública] para cobrir seus défices maciços.

Agora esta estratégia deu um passo em frente através de uma provocação flagrante: a execução do clérigo xiita Nimr al-Nimr.

A Casa de Saud acredita que atiçar as chamas da confrontação Riad-Teerão pode aumentar o factor medo na esfera da oferta de petróleo, levando a preços mais altos (que ela precisa), mantendo o Santo Graal Waabita que consiste em manter fora do mercado o petróleo iraniano cuja chegada é iminente.

Desde o princípio Riad apostou na possibilidade de sanções suplementares contra o Irão relativas à energia caso de Teerão reagisse energicamente à sua provocação da decapitação. Mas os iranianos são demasiado refinados para cair numa armadilha tão grosseira.

Os traders do Golfo Pérsico confirmaram que o orçamento saudita de 2016 se baseia num preço médio do petróleo bruto de apenas US$29 por barril , como mencionado pela primeira vez pela Jadwa Investment, em Riad.

Da perspectiva da Casa de Saud o dilema orçamental é absolutamente insustentável. A Casa de Saud é o maior exportador de petróleo da OPEP. Mas a sua arrogância suprema é negar ao Irão qualquer margem de manobra em exportações, o que será inevitável especialmente no segundo semestre de 2016. Além disso, a estratégia do baixo preço de petróleo não se aplica unicamente ao Irão: ela também faz parte da guerra petrolífera contra a Rússia.

Alguém não está a fazer as contas certas em Riad. A estratégia saudita do baixo preço do petróleo tem estado a punir a Rússia – o produto global número dois – severamente. Os sauditas não podem esperar que as suas decapitações provocadoras acarretem simultaneamente um acordo OPEP-Rússia sobre cortes de produção e levem também a preços de petróleo mais altos, o que beneficiaria principalmente – imaginem quem – o Irão e a Rússia.

Seis meses para destruir a Rússia

Pode-se dizer sem engano que a estratégia do baixo preço do petróleo tramada pela Casa de Saud tem sido desde o começo um hara-kiri waabita em câmara lenta (o que, a propósito, não é certamente uma coisa má).

O orçamento da Casa de Saud entrou em colapso. Riad está a financiar uma guerra invencível e muito cara ao Iémen, a financiar e armar toda espécie de salafitas e jihadistas na Síria e a gastar fortunas para escorar al-Sisi no Egipto contra qualquer possível ofensiva do Daesh (Estado Islâmico) e/ou da Fraternidade Muçulmana. Como se isto não fosse bastante, internamente a sucessão é uma confusão real, com o comandante em chefe do rei Salman, Mohammad bin Salman, de 30 anos, ostentando diariamente uma mistura tóxica de arrogância e incompetência.

Como era de esperar, mais uma vez Riad está a seguir as ordens de Washington.

O governo dos Estados Unidos está a tentar freneticamente manter baixo o preço do petróleo para destruir a economia russa, utilizando seus apaniguados, produtores do Golfo Pérsico, que estão a extrair tudo o que podem. Isso representa não menos de sete milhões de barris por dia acima da quota da OPEP, segundo traders do Golfo Pérsico. O governo dos EUA acredita que pode destruir a economia russa – outra vez – como se o relógio tivesse andado para trás até 1985, quando a superabundância global era de 20 por cento da oferta mundial de petróleo e a União Soviética estava atolada no Afeganistão e internamente sofria uma hemorragia fatal.

O petróleo baixou até os US$7,00 por barril em 1985 e é para esse número baixo que o governo estado-unidense tenta agora conduzir o preço. Mas hoje a superabundância global é de menos de três por cento da oferta mundial de petróleo, não de 20 por cento como em 1985.

O excedente hoje é de apenas 2,2 milhões barris/dia, segundo a Petroleum Intelligence Weekly. O Irão provocará inicialmente um acréscimo de 600 mil barris/dia de petróleo novo, ainda em 2016. Isso significa que antes do fim deste ano teremos um excedente potencial de 2,8 milhões b/d.

O problema é, segundo traders do Golfo Pérsico, um esgotamento anual de sete milhões de barris por dia – e que não pode ser substituído devido ao colapso na perfuração. O que isto significa é que todo excedente de petróleo poderia ser aniquilado no primeiro ou segundo trimestre de 2016. Em meados de 2016, os preços do petróleo deveriam começar a emergir dramaticamente, mesmo com o petróleo adicional do Irão.

Assim, a estratégia do governo estado-unidense entrou agora em metástases ao tentar destruir a economia russa antes da recuperação inevitável do preço do petróleo. Isso daria ao governo dos EUA uma janela de oportunidade que abrange apenas os próximos seis meses.

Que tudo isto possa ter sido realizado até agora é um testemunho, mais uma vez, da força irresistível dos manipuladores da Wall Street. Eles são capazes de criar um crash quando quase não há qualquer excedente de petróleo. Mas mesmo quando o Império do Caos manipula freneticamente o preço do petróleo para baixo, ele pode não baixar suficientemente rápido para destruir a economia russa.

Mesmo a Reuters foi forçada a admitir laconicamente que o excedente de petróleo era de menos de dois milhões de barris por dia e pode mesmo ser, de modo alarmante , de menos de um milhão b/d antes e atingir a estória habitual do fundo do poço. Esta informação sobre o excedente real de petróleo até agora tem sido completamente censurada. Ela confronta de chofre a narrativa estado-unidense hegemónica de excedentes que perduram para sempre e do iminente colapso da economia russa.

Quanto à Arábia Saudita, ela é apenas um simples peão num jogo muito mais asqueroso. Agora o senso comum determina que é essencialmente um assunto daDaesh Negro (o falso “Califado”) e de Daesh Branco (a Casa de Saud). Afinal de contas, a matriz ideológica é a mesma, decapitações inclusive. Isto é a próxima etapa da guerra do petróleo que pode muito bem decidir qual dos Daeshs será o primeiro a cair.

O original encontra-se em https://www.rt.com/op-edge/328097-oil-saudi-iran-war-crisis/

ÚLTIMAS NOTÍCIAS