Esses dias entrei em discussão com um sujeito que se dizia esquerdista – aquele tipo que adora ficar nas teorias, com argumentos e performances vazias, mas jamais se arrisca na prática, achando que apenas suas “opiniões” são suficientes para fazer uma nova revolução. Sua crítica era sobre Lula e Dilma, chegando a ponto de classificar o PT como “neoliberal” – e, como sempre fazem, me chamando de “petista”, mesmo não sendo filiado a qualquer partido.
Pois bem. De forma educada, tentei mostrar para ele que a ideia utópica do socialismo não se pode nem imaginar nos dias de hoje por dois motivos simples: mundo globalizado e desigualdade social.
Afinal, as ideias e teorias marxistas/leninistas – das quais admiro e sonho –, incluindo a luta de classes, é algo difícil de se conscientizar e concretizar quando vemos famílias passando fome. Como falar em luta de classes, se não se têm o que comer? Assim, quis mostrar para o tal esquerdista que apesar de sonhar com um sistema socialista, primeiramente temos que suprir as necessidades mais emergências da população, para só depois trabalhar na mesma esse tipo de conhecimento e formação. E é, a meu ver, o que os governos petistas vinham desempenhando. Baseado na ideia keynesiana – me corrijam se estiver errado – fez com que o Estado promovesse desenvolvimento social, inclusive com programas sociais, distribuição de renda, mercado interno de consumo, promovendo o fluxo econômico do país.
A crítica que faço é que enquanto isso foi feito, esqueceu-se o trabalho de base, justamente na formação e educação. Motivos para isso: negligência ou falta de tempo hábil? Já não sei, e deixo para que cada um tire suas conclusões e façamos a discussão.
É óbvio que a ideia de uma revolução socialista, tal como em Cuba e até mesmo na Venezuela, é o sonho de qualquer amante de Marx/Lênin. Mas sejamos realistas. Hoje, em função do contexto mundial, é algo puramente utópico e ideológico.
Enquanto isso, ao propor a unidade da esquerda para enfrentarmos os retrocessos e o avanço cada vez mais preocupante da direita – tanto neoliberal como fascista – o indivíduo preferiu atacar o PT, Lula e Dilma. E é esse o erro que não podemos cometer.
Todos sabem da importância e representatividade do PT no campo progressista, no entanto, sozinho não tem e nem terá forças – daí, por exemplo, a necessidade de alianças com partidos como o (P)MDB. Enquanto militante de esquerda, é claro que não teço apenas elogios ao PT, pois muitos equívocos foram tomados – como o próprio presidente Lula disse em entrevista certa vez ao grandioso Mino Carta, “você sabe muito bem que não sou de esquerda”, em resposta a indagação justamente sobre o aspecto teórico, além, óbvio, de algumas posturas econômicas tidas como neoliberais. No entanto, temos que aprender com os erros e, acima de tudo, valorizar os acertos – cito novamente as políticas sociais e o avanço nas políticas e relações exteriores, que proporcionaram o papel de protagonista ao Brasil no cenário mundial.
Lembremos que durante as gestões do PT, criamos 22 milhões de empregos (mantendo a taxa de desemprego em 4,3%), tivemos o aumento real dos salários acima da inflação e 35 milhões de pessoas saíram da miséria, o que fez com que com que país saísse do fatídico “Mapa da Fome” da ONU. Não podemos esquecer também de um aspecto extremamente importante que foi priorizado nos governos petistas: o fortalecimento da indústria nacional através de um plano de Política Industrial baseado em inovação e emparelhamento com países desenvolvidos. Afinal, é justamente a capacidade industrial de uma nação que estabelece seu potencial, proporcionando o crescimento de renda e bem-estar da população, justamente por gerar empregos mais qualificados, refletindo diretamente na renda.
Antes, como retrata brilhantemente Eduardo Galeano em seu livro “As veias abertas da América Latina”, o capital era puramente explorador dos commodities e matéria-prima, usando e abusando da mão-de-obra barata – sem falar na degradação ambiental com a implantação de novas indústrias multinacionais. Hoje, como lembra Emir Sader, o capitalismo não é mais produtivo, e sim financeiro concentrando riquezas em papéis, especulação financeira. A defesa atual do capital pela direita baseia-se na especulação. E por isso que a indústria deve ser fortalecida, o que, infelizmente não vemos – voltamos à ideia de “país colonizado”, mero fornecedor de bens que serão superfaturados, afinal, “o subdesenvolvimento não é uma etapa do desenvolvimento. É a sua consequência”, como lembra Galeano.
As atuais políticas globais e todo trâmite existente em quebrar países que ascendem – seja com argumentos falaciosos de “instaurar democracia” e “combate à corrupção” –, em interesse e subserviência ao capital, infelizmente obrigam aos mesmos recorrerem ao auxílio do Fundo Monetário Internacional/Banco Mundial – leia-se, Estados Unidos – o que gera um ciclo vicioso. Citando novamente Galeano: “Quem empresta, manda. Para pagar, é preciso exportar mais, e é preciso exportar mais ainda para financiar as importações e fazer frente à hemorragia de lucros e royalties que as empresas estrangeiras drenam para suas matrizes. O aumento das exportações, cujo poder de compra diminui, implica salários de fome.A pobreza massiva, chave do êxito de uma economia voltada para o exterior, impede o crescimento do mercado interno de consumo na necessária medida para sustentar um desenvolvimento econômico harmonioso. (…) O círculo vicioso é perfeito: a dívida externa e o investimento estrangeiro obrigam à multiplicação das exportações, que o mesmo investimento e dívida vão devorando. (…) O principal produto de exportação da América Latina, venda o que vender, matéria-prima ou manufaturas, são os braços baratos.
Outro ponto que não podemos esquecer é que a figura de Lula é algo que não agrada principalmente os interesses dos EUA. Sendo o estadista que é, articulador nato, Lula incomodou – e ainda incomoda – os interesses ianques. Ao lutar ao lado de China, Rússia, Índia e África do Sul para a formação do BRICS, também por evitar a ascensão da ALCA, Lula mostrou sua força de coesão com demais lideranças anti-imperialistas. Como resposta, a trama da Lava (Farsa)-Jato teve sim apoio e financiamento dos EUA, o que gerou não apenas sua prisão arbitrária – com base em “ato de ofício indeterminado”, ou seja, em algo inexistente – mas também, sendo impedido de concorrer à eleição – a saber, as pesquisas mostram que Lula tinha ampla vantagem e inevitavelmente seria eleito.
Assim, é hora de deixarmos o ego de lado e formarmos uma base de esquerda única, forte. Só assim poderemos confrontar e vencer essa batalha, a qual estamos sendo derrotados diariamente, desde o Golpe de 2016. Lutarmos por um país democrático exige isso. A valorização do Estado e seu nacionalismo é o que permitirá a redução da desigualdade que, infelizmente, está em crescente depois das reformas trabalhistas, privatizações e todo pacote de maldades que Temer e cia começaram a fazer e persistem no atual desgoverno. Como diz Eduardo Galeano, “os navios negreiros já não cruzam o oceano. Agora os traficantes de escravos operam no Ministério do Trabalho”.
Talvez o período pandêmico que vivemos possa obrigar o mercado mundial a rever seu sistema político, como projetam alguns pesquisadores, uma vez que ficou evidente a necessidade de um Estado forte e presente, contrariando a visão neoliberal que se enfraquece e dilui, fortalecendo uma certa vertente socialista. Mas para isso, reforço a necessidade de unidade entre os progressistas. Esse tipo de “esquerda cirandeira” não pode seguir seu baile isoladamente, querendo ser “mais esquerda”, pois todos nós continuaremos dançando e sendo açoitados pela roda vertiginosa da direita – e deturpando totalmente a unidade defendida pela verdadeira ciranda de Lia de Itamaracá e a luta contra a opressão do sistema.
(Em tempo: logo após minha resposta, o sujeito me bloqueou na postagem).
*Professor, Biólogo, Doutor em Etologia, Mestre em Ciências, Especialista em Bioecologia e Conservação
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Prof. Luiz Fernando Leal Padulla
*Biólogo*
Doutor em Etologia
Mestre em Ciências
Especialista em Bioecologia e Conservação
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