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quarta-feira, 17 abril, 2024

Lula comprova ser a força central que põe o governo em crise, orienta uma nova etapa para o Brasil e a América Latina

Helena Iono – Buenos Aires

A primeira entrevista de Lula à Folha de São Paulo é um tsunami de dignidade e inteligência que rompe as grades da sua injusta prisão e o liberta das garras do “lawfare” imperialista para dar ânimo e centralidade à vanguarda e ao povo brasileiro no combate organizado ao neoliberalismo fascista encabeçado por Bolsonaro-Guedes-Moro.

A possibilidade em si desta entrevista, deixa transparecer a guerra entre os antigos aliados que se uniram para conspirar contra o governo da Dilma e alijar o PT do governo, e sufocar a liderança de Lula; deixar Lula falar é usar a artilharia contra a Lava Jato e seus aliados no STF; é um sinal de significativos desacordos entre as forças neoliberais e oligárquicas e militares que respaldaram a candidatura de Bolsonaro, preocupadas agora com o desastre político derivado do desgoverno, e com o crescente descontentamento social, a perda de mercados nacionais e internacionais (da China ao Oriente Médio), dificultando a aplicação “pacífica” dos saqueios previdenciários e das privatizações pelas quais se uniram.

Mas o principal, e que fugiu aos cálculos da burguesia, foi a genial capacidade de Lula, de aproveitar esta brecha entre os contendentes para expor não só a força e a dignidade dos justos e inocentes, mas sobretudo, a experiência política, a inteligência de classe do sindicalista operário, a riqueza de sentimentos e ideias de quem criou um Partido dos Trabalhadores de massas, dirigiu um país, e que continua sendo um líder mundial contra os EUA e o imperialismo. É a força histórica de Spartacus e David contra os opressores; de um líder que faz jus ao papel de indivíduos especiais que surgem na história, a distâncias de tempos, concentrando uma consciência e necessidade latentes de um povo, como já definiu o russo Giorgi Plekhanov, nos primórdios do século XX, no seu livro, “O papel do indivíduo na história”. Esse Lula entrevistado, mais livre e solto de ideias como nunca, é um alerta para não subestimar a qualidade do povo brasileiro que gerou cantores como Beth Carvalho, e que se encontra golpeado, desorganizado, mas não morto.

A entrevista de Lula comoveu o mundo onde fervilharam manifestações por “Lula Livre”, antes, durante e depois da mesma. Desde Perez Esquivel, ao lado de Dilma Rousseff e Lindberg Farias nos Comitês por Lula Livre e Justiça por Marielle na Argentina; Jean Jacques Mélenchon na França; ao presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel, convocando em Cuba um multitudinário Primeiro de Maio dedicado à libertação de Lula; são alguns dos elementos que revelam como o mundo conta com a reversão do golpe institucional reacionário no Brasil onde o papel de Lula, e a sua libertação, tornam-se mais que nunca, decisivos.

A segurança de classe de Lula, não descartou a tática de dirigir-se e pesar nos setores internos do poder Judiciário, sem ódio, e tampouco ingenuidades, recordando o passado, durante seu governo, na expectativa de fazê-lo retomar a constitucionalidade democrática. Há que ver porém, até onde vai o STF; quais os limites da justiça e da institucionalidade burguesa, e que a realidade é que Lula ainda é um preso político. Como o próprio Lula deixa claro ao dizer que o pacto social da constituição de 88 foi rompido. O exemplo da batalha que se desenvolve na área judicial argentina, o escândalo do D’Alessiogate, do comprometimento entre serviços de espionagem dos EUA com promotores, juízes e executivos do governo Macri, no lawfare contra Cristina Kirchner, refletem a podridão da Justiça burguesa. O PT, a esquerda e os partidos progressistas em geral, deixam passar o questionamento à representatividade de juízes com imunidade perene. Não se trata apenas de questionar altos salários e privilégios, mas, as indicações decretadas pelo poder político vigente, sem representatividade e voto popular, sem a revogabilidade de mandato de juízes e juristas à luz do respeito à Constituição; e Constituição que fosse legitimada por Assembleias constituintes livres e soberanas.

Lula pautou todos os pontos, inclusive o das Forças Armadas que incubam divergências de tendências provavelmente exacerbadas pela crise da burguesia; até recorreu à memória dos que iniciaram a distensão no pós-64, como Geisel; para tratar de sacudir aos que possam, no contexto atual, prezar pela soberania nacional violentada no pós-2016. A alusão a Vargas foi importante para recuperar o elo e a memória nacionalista. O apelo é justo, sobretudo em momentos em que se aprofundam as privatizações na Petrobrás e na Previdência social, ocultadas pela Globo, Record, Veja e pelos grandes meios de comunicação e as redes sociais golpistas.

É preciso ver também, qual a extensão de uma possível discussão nos extratos dos sub-oficialato militar, expressas pela intervenção pouco difundida do sargento Elisandro Souza, da Associação Nacional de Praças, na Comissão de Direitos Humanos do Senado, onde ataca a Reforma Previdenciária que atinge civis e militares, denotando um nível de politização, ao referir-se às denuncias de Maria Lúcia Fatorelli contra os mecanismos decisivos de poder das finanças internacionais no Brasil. A questão da soberania nacional está deixando inquietas certas camadas militares e Lula convoca a não ignorá-las.

A grandeza dirigente de Lula, que teve a dignidade de não expressar seu desejo de libertar-se, mas de libertar seu povo oprimido e trabalhador, é um chamado a enfocar a cidadania na luta contra a reforma da previdência e as privatizações; é um chamado a organizar-se, a mobilizar-se, muito além de repetidas manifestações na Avenida Paulista, mas indo aos rincões distantes, estimulando o povo a cobrar dos deputados e legisladores a obediência aos direitos humanos e trabalhistas dos seus eleitores. É uma convocação a ouvir a voz dos bairros, fábricas, dos sem-teto, dos sem-terras, das escolas, das rodoviárias e feiras populares, dando organicidade, recriando núcleos de PT, rádios comunitárias e jornais populares. Manifestações sim, mas sobretudo com formas permanentes de organização e de resistência  para garantir a democracia, a cultura nacional e popular nas escolas, pautando o tema do fechamento das fábricas e do comércio, e do desemprego; descer às bases, além dos sindicatos que se esforçam por superar sua crise, não só de passividade burocrática, mas de desarticulação e enfraquecimento gerados pela premeditada flexibilização trabalhista e desconcentração operária.

Lula, é um estímulo à luta e à unidade dos partidos de esquerda e progressistas, movimentos sociais, para debater os problemas centrais da soberania nacional, os efeitos das privatizações da Embraer, da Petrobrás, a defesa da previdência social. Chegará o momento em que a questão social um dia explodirá, quando os efeitos mais deletérios das reformas trabalhista e previdenciária tocarem o fundo. E não haverá fakenews, nem ataques cibernéticos que poderão deter. A Venezuela dá um exemplo na América Latina, da força de um projeto de nação e soberania, de organização cívico-militar, que permite avançar contra a rapina norte-americana e a agressão do novo Plano Condor em plena execução. A Venezuela de Hugo Chávez/Maduro necessita da solidariedade internacional, mas é antes de tudo, um exemplo a seguir pela tenacidade da resistência ao imperialismo, pela aliança cívico-militar, por manter a população trabalhadora mobilizada, ativa e participante. Neste primeiro de maio, Maduro e o governo venezuelano contaram com 15 km de maré humana que desfilou no seu apoio contra o fracassado golpe reacionário dos títeres dos EUA, Guaidó e Leopoldo López. Isso não foi transmitido pelos meios hegemônicos, somente por Telesul.

 

Lula Livre, sem dúvidas, é a meta fundamental neste momento para a garantia do estado de direito e da democracia e contra o processo repressivo ameaçando a organicidade e a conscientização popular. Sem Lula Livre não há garantias constitucionais, nem democracia para o povo brasileiro, o que se pode conquistar somente com povo organizado lutando pelos seus direitos.

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