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segunda-feira, 18 março, 2024

Nova realidade social sob o domínio financeiro

Pedro Augusto Pinho*

Ainda não houve a indispensável divulgação da mudança extraordinária que ocorreu no mundo, mas, no que me é importante, no Brasil; que altera, de modo radical a luta social e a conscientização do povo.

Não há única matriz, mas diversos eventos que, embora se desenvolvessem independentes, tiveram uma orientação, certa homogeneidade e o mesmo destino para formação do poder.

Estes eventos são:

  1. a) o acirramento das contradições do capitalismo com o poder cada vez maior do capitalismo financeiro e seu braço operacional: o sistema financeiro internacional, a banca, como o abrevio;
  2. b) o apogeu tecnológico com base na teoria da informação. A informática atinge todo sistema produtivo e, em decorrência, a condição de trabalho;
  3. c) outras vertentes da informação são a comunicação de massa e a mídia digital;
  4. d) alteração nos centros de poder com consequências relevantes para as instituições político-administrativas; e
  5. e) novos padrões morais.

Poderia acrescentar a relação do homem com a natureza, mas as alterações foram decorrentes da tecnologia e da busca por insumos novos.

Todos estes eventos tiveram condições históricas e realidades regionais distintas. E não pretendo desenvolvê-los em sua universalidade, mas restringir meu olhar ao Brasil.

O BRASIL QUE NUNCA SE INDUSTRIALIZOU

Li, certa época, que a grande tragédia era entrar na decadência sem ter vivido o apogeu.

Examinando nossa história vemos que os interesses coloniais sempre foram condicionantes de nossa evolução civilizatória. Não perderemos tempo com o Império, embora algumas mazelas daquele período se perpetuem.

Creio que o grande romance “Macunaíma, o herói sem nenhum caráter”, de Mário de Andrade, apresenta alguns elementos que nos instruem sobre estas mazelas. A mais danosa, cruel e permanente é que o Brasil escondeu o trabalho.

“Ai! Que preguiça!…

E não dizia mais nada. Ficava …….. espiando o trabalho dos outros”. (todas citações são da 19ª edição, pela Editora Itatiaia, 1983).

O senhor é retratado, valorizado, estudado em oposição ao escravo, escondido, menosprezado, agredido. Jamais houve um partido, um projeto nacional de construção da cidadania. Esta herança será fundamental para a dominação colonial. Voltarmos para o exterior. Hoje, quando o conjunto das contradições torna a vida da classe média difícil, sem horizonte, não se pensa em reconstruir o País, reformar as instituições, mas “ir para Portugal”.

“Inda não tenho bastante força não. Macunaíma refletiu. Agarrou num dente de ratinho chamado crô, fez uma bruta incisão na perna, de preceito pra que é frouxo e voltou sangrando para pensão”.

O incrível é o desgarramento da realidade e o apelo macunaímico à fantasia. No romance, alguns bons críticos apontam o Brasil de Mário de Andrade como “um país em formação”. Mas já se passou um século, houve profunda e ampla mudança econômica e tecnológica, e continuamos buscando o milagre de fora, sem consciência de nós mesmos.

Poderia, sem estar simplificando em excesso, afirmar que a luta republicana foi pela industrialização, sempre provocadora dos golpes para os retrocessos.

O maior contato das Forças Armadas com a capacitação industrial, pelo avanço bélico, em especial da I Grande Guerra, fez surgir o tenentismo, fonte da Revolução de 1930.

A Revolução de 1930, como ocorrerá neste século 21 com os governos Lula, buscou uma acomodação dos impulsos progressistas das Forças Armadas (que não era unânime, mas majoritário) com os interesses da poderosa classe rural. A contrarrevolução de 1932 mostrou a Vargas que havia muito mais do que a insatisfação de um segmento da elite paulista. Havia o antigo dominador, o capital financeiro inglês, desejando reapoderar-se do Brasil. O Estado Novo, com apoio do novo colonizador – os Estados Unidos da América (EUA) – sufocou, mas não extirpou o que chamamos hoje “ruralismo”.

O golpe contra Getúlio foi o golpe contra a industrialização nacionalista, contra o poder que se formava no Brasil. São inúmeros os fatos, como o narrado pelo jornalista José Augusto Ribeiro sobre a chantagem de Assis Chateaubriand contra a criação da Petrobrás, que comprovam. As medidas de Café Filho, diametralmente opostas a de Vargas, parecem as de Temer substituindo Dilma Rousseff.

Tentaram-se golpes contra Juscelino, posse de Jango e finalmente, em 1964, vence o anti-industrialismo. Mas ainda permanecia um sentimento tenentista nas Forças Armadas e ocorre o contragolpe de Costa e Silva e o Brasil conhecerá, por 12 anos, o progresso industrial (1967-1979).

Devemos assinalar que, durante o Governo Geisel, que desenvolveu com algum sucesso as quatro tecnologias de ponta: informática, aeroespacial, nuclear e das energias renováveis, o mundo estava sendo dominado pelo capitalismo financeiro. E será a banca que aplicará os golpes para designação do General Figueiredo e para eleições de Collor e de Fernando Henrique Cardoso (FHC).

CONVIVÊNCIA IMPOSSÍVEL COM A BANCA

No século passado apontava-se a impossibilidade de conviverem o capitalismo industrial e o socialismo industrial. Desdobrou-se na industrialização bélica (complexo industrial-militar) em ambos os mundos: EUA e União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). As tentativas de harmonização socialismo-capitalismo, como a democracia cristã e a social-democracia, foram detonadas por ambas ideologias, procurando a hegemonia em sua própria área de ação, seus espaços nos Estados nacionais: à direita e à esquerda.

Mas se havia a industrialização como plataforma comum, hoje, com o capitalismo financeiro, não existem pontes identificáveis entre a esterilidade rentista e o investimento reprodutivo. São, agora sim, dois mundos irreconciliáveis.

Vejamos no campo das instituições. O sistema financeiro vem destruindo os Estados Nacionais. É a consequência óbvia de um modelo que não gera atendimento às necessidades humanas, centrado na financeirização da vida e na concentração de riqueza. Os Estados Nacionais, mesmo com suas mínimas condições de sobrevivência, constituem um entrave á circulação do dinheiro e ao valor máximo, especulativo, do capital. Luiz Gonzaga Belluzzo, em artigo de 14/08/2018, “Acionistas de Valor”, escreve sobre “maximizar a extração de valor de um ativo já existente em detrimento da criação de valor mediante o investimento em um novo ativo reprodutivo”.

Este capitalismo financeiro passa a ser o centro irradiador da corrupção.

Vejamos a efetiva economia atual. Considerando o Produto Interno Bruto do Brasil (PIB) de US$ 1,8 trilhões, sabemos de quatro Fundos de Investimentos, podem ser mais, com valores muito superiores ou iguais à soma de nossas riquezas.

O gigantesco Blackrock com US$ 6,4 trilhões, o Vanguard Group com US$ 5,1 trilhões, o State Street Global Advisors com US$ 2,8 trilhões, Fidelity Investments com um PIB brasileiro. Como agem estes fundos?

Primeiro dominam todo um segmento econômico. Se você ainda se ilude com a concorrência, com a competição, saiba, por exemplo, que as grandes fabricantes de automóvel no ocidente (Ford, General Motors, Fiat, Volkswagen) tem entre seus principais acionistas a Blackrock e a Vanguard. O mesmo ocorre nas petroleiras, nas fabricantes de alimentos, produtos de higiene, farmacêuticos e em muitos mais. Ou seja, o mundo está nas mãos destas e de outras de menor porte mais poderosas, como, a Berkshire Hathaway, do bilionário Warren Buffet, com investimentos de quase meio PIB do Brasil, ou a europeia, Allianz Global Investors, com cerca de US$ 590 bilhões, etc.

E estes capitais tem, em grande parte, endereços nos paraísos fiscais.

Segundo, submetendo os Estados Nacionais ao seu domínio, quando não for  possível destrui-los (Líbia, Iraque, Ucrânia, Afeganistão). No Brasil, a banca, que já se apossara da mídia, concentrada em seis grupos familiares, comprou a cúpula do judiciário. Estas duas aplicações eliminaram a legislação em vigor, a garantia jurídica, e a confiança nas instituições, o reconhecimento do Estado.

Vivemos, pois, num Estado de absoluta insegurança: da existência, da propriedade, do uso e receita dos bens, do emprego, dos atendimentos de toda ordem. Um faroeste de cinema onde não há o mocinho.

SEGREDO DO MÁGICO E ALIENAÇÃO NACIONAL

É velho o truque do mágico: chama a atenção para onde não faz a mágica. A corrupção foi o truque do mágico para o golpe de estado e a implantação de um governo 100% da banca. Isto é, todos “poderes” da República agem e decidem favoravelmente ao sistema financeiro internacional.

O mais danoso é o poder judiciário. Por muitos anos, o poder judiciário estadunidense condenando grandes corporações, pessoas milionárias, manteve a confiança das demais instituições e do povo, foi poder sem contestação. No Brasil, atual o poder judiciário, com a cúpula inteiramente dominada pelos interesses da banca, perdeu a credibilidade e o respeito da população. É um poder sem perspectiva, que pode ser destituído por um governo nacionalista ou popular. Ele é gerador da insegurança.

E, assim, vão sendo alienadas as riquezas naturais e industriais do Brasil.

“Macunaíma aproveitava a espera se aperfeiçoando nas duas línguas da terra, o brasileiro falado e o português escrito”.

O Brasil de hoje tem duas línguas, duas percepções: a da elite voltada para fora e a do povo vivendo e voltado para o País.

O colonizador, a banca, coloca no poder os que não têm compromisso com a nacionalidade, Nacionalismo passa a ser o comunismo do século passado.

E o capitalismo financeiro, sem compromisso que não seja da multiplicação do capital e da conquista do poder, assume as mais diversas e contraditórias causas para cooptar pessoas, partidos, organizações.

Se o luta das mulheres pelo controle de seu corpo tem mais aceitação, ali ele será a favor do aborto; se a sociedade é bastante conservadora e a Igreja tem influência, a banca será contra o aborto. Foi assim que obteve voto socialista na França e, na eleição seguinte, voto conservador. Nas questões transversais, a banca é contra e a favor de todas as causas. O que desconcerta e desnorteia muitos cidadãos sérios e crédulos.

O comportamento da banca, nesta eleição presidencial no Brasil, seria até cômica se anunciasse a grande tragédia do fim do Estado Nacional.

A paz está longe de ser um objetivo da banca. Assim, podemos ver a mão visível do mercado nos candidatos bélicos, que abertamente pregam a distribuição de armas, a violência física, e nos candidatos que tentam convencer do paraíso que espera a sujeição de tudo e todos as capital financeiro.

Não creio ser difícil, ao atilado leitor, verificar a direção da mão do mágico e não se iludir. Nam tanto, diria eu, como os candidatos aos cargos executivos, mas, e principalmente, aos cargos no Congresso Nacional.

Este Congresso chegou ao fundo do poço, quando, de modo agressivo e farsante, no domingo, 17 de abril de 2016, 367 deputados federais votaram pelo afastamento da Presidente Dilma e 137 contra. Decisão confirmada pelo Senado e pela omissão do Supremo Tribunal Federal (STF). Como se expressou o senador Romero Jucá, do MDB de Roraima, presidente do partido, “com o Supremo, com tudo”.

Assim, os brasileiros precisam saber que mais do que candidatos, estará elegendo a possibilidade do reerguimento do Estado Nacional Brasileiro ou uma enorme e rica colônia da banca, ao votar em outubro próximo.

*Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado

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