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quinta-feira, 28 março, 2024

Os desafios do Podemos nas eleições espanholas

Partido que surgiu em 2014 comprometido com os jovens ameaça o bipartidarismo tradicional, mas tem de encarar o jogo da mídia, empenhada em provocar uma onda de rejeição a seu nome.
Por Emir Sader, no Rede Brasil Atual

O partido Podemos surgiu na Espanha com a coragem de transformar a rebeldia das mobilizações de jovens em praças públicas de protesto contra as velhas formas de fazer política. O desafio não é pequeno: transformar a indignação em alternativas concretas, superando as fáceis e impotentes alternativas do protesto pelo protesto, da suposta “autonomia dos movimento sociais”, do abandono de qualquer disputa pela hegemonia política na sociedade.

Para isso, o Podemos tem de enfrentar muitos obstáculos até chegar à prova das eleições gerais do próximo domingo (20). A emergência de um novo partido, que colocava em risco o bipartidarismo tradicional, comprometido pelos dois lados – o PP e o PSOE – com a austeridade econômica, que destrói conquistas sociais históricas, rapidamente fez com que esses partidos tradicionais acendessem o sinal amarelo e começassem a deflagrar uma operação que contivesse a ascensão aparentemente irresistível do Podemos.

De imediato, a mídia começou a levantar “escândalos” contra seus jovens dirigentes. Um e outro não teriam cumprido estritamente os contratos nas universidades públicas, um terceiro teria introduzido ilegalmente no país recursos recebidos de assessorias prestadas em países latino-americanos, especialmente a Venezuela.

Tratava-se de forjar níveis de rejeição à nova organização, que fizessem com que eles também aparecessem vinculados a comportamentos ilegais, dos quais eles acusavam os partidos tradicionais. Foi subindo assim rapidamente a rejeição da imagem pública do Podemos, assim como de seus líderes, freando o crescimento aparentemente avassalador da adesão à nova organização.

Por outro lado, conscientes das ameaças, os partidos mais tradicionais tomaram providências. O Partido Socialista Espanhol (PSOE) – com histórico de centro-esquerda e de, nos últimos anos, concessões a teses liberais – elegeu um jovem como seu secretário-geral, para tentar competir com a figura atraente de Pablo Iglesias, o principal dirigente do Podemos, assim como vários de seus outros dirigentes.

Além disso, ante a ideia da renovação da política fortemente presente hoje na sociedade espanhola, surgiu uma espécie de Podemos de direita, isto é, um movimento que igualmente propõe a renovação da política, mas com propostas e estilos conservadores – Ciudadanos, ou Cidadãos –, também dirigido por um jovem político.

O Cidadãos tirou muitos votos do Partido Popular – o PP, historicamente situado no campo mais conservador –, mas cresceu além disso, ficando em segundo lugar nas pesquisas e permitindo que, somado ao PP, a direita tivesse hoje mais votos do que nas eleições passadas. Caso os dois partidos chegassem a um acordo, disporiam de uma maioria mais folgada no Parlamento do que atualmente dispõe o PP sozinho.

O Podemos havia ficado relegado ao quarto lugar, pelo efeito das campanhas contra ele, mas quando os debates começaram, Pablo Iglesias ganhou todos, com grande vantagem, para quem quer que tivesse feito a pesquisa. Superou assim o PSOE e subiu para o terceiro lugar nas pesquisas.

O anunciado fim do bipartidarismo, quando surgiu o Podemos, de alguma forma foi atingido, mas sem afetar a hegemonia da direita. As ambições do Cidadãos podem dificultar a aliança com o PP, mas é uma tendência que tende a se dar. O PP perderia a comodidade de governar sozinho, teria de fazer grandes concessões em termos de cargos, mas no substancial as políticas conservadoras tenderiam a se manter.

O Podemos faz sua irrupção no cenário político, com menor presença do que se esperava no começo, mas com boa capacidade e recuperação durante a campanha. Se se confirmam as pesquisas, as maiores vítimas serão o PSOE e Esquerda Unida (IU). O PSOE com o pior resultado da sua história e deslocado por Podemos como alternativa ao governo. E o IU perdendo o espaço de representante histórico – que inclui o Partido Comunista –, da esquerda radical na Espanha.

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