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quinta-feira, 28 março, 2024

Panorama Pós-eleitoral: Brasil no Mundo (I)

Pedro Augusto Pinho*

A eleição de outubro de 2018 foi preparada com quatro anos de antecedência. Mas o planejamento estratégico para conquista do Brasil vem desde o início do século.

Se, em outra época, nos defrontamos com poderes nacionais, ou ideologias conduzidas por Estados Nacionais, temos desde 1990 uma situação inédita. Há um sistema, acima dos Estados, que busca a hegemonia mundial: o sistema financeiro internacional, a banca.

Este sistema já aparelhou parcialmente a estrutura do governo dos Estados Unidos da América (EUA), da maioria dos países da Europa Ocidental, de países latino-americanos, africanos e asiáticos.

De tal forma que a bipolaridade da guerra fria, a unipolaridade de 1989, a pretensa multipolaridade deste século, se defrontam hoje com três poderes com ambições globais. Por ordem de maior para menor poder temos: a banca, o mercantilismo chinês e o império estadunidense.

Pode ser estranho, para o caro leitor, esta posição dos EUA. Mas chamo a atenção da luta que se desenvolve, naquela nação, pelo controle do Estado, de um lado a Casa Branca, com Donald Trump, e, de outro, as instituições dominadas pela banca. Comparando com o Estado Nacional Brasileiro, todos são enormemente poderosos e, de algum modo, potenciais colonizadores.

Para entendermos o Brasil é necessário compreender as forças que movem o mundo de hoje, não as de ontem ou de 60 anos atrás. E estas são as que enunciei.

Perguntará meu arguto leitor: e a Rússia, a Federação Russa?

É óbvio que se trata de uma grande potência; mas, quer pelos bloqueios e sanções, quer pelo desenvolvimento tecnológico autônomo, quer pelas questões de seu vastíssimo território, a Rússia voltou-se para dentro, para ocupação da Rússia Asiática e para defesa das fronteiras, de suas áreas de influência. Se algum conflito visualizo com ela, atualmente, será mais provável com as fronteiras chinesas do que as ocidentais. Embora estas últimas venham sendo acossadas pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), insepulto cadáver da guerra fria, a serviço da banca.

Brasil e as Potências Coloniais do Século XXI

Organizemo-las no sentido inverso do poder.

I – Os EUA

Os EUA dominaram o Brasil a partir da Revolução de 1930, substituindo o Império Britânico, por duas vertentes: econômica e cultural.

Não tivemos, como em alguns países das Américas e de outros continentes, a presença militar. Mas sentimos sempre suas instituições de espionagem, contraespionagem, de ações subversivas, que hoje se transformaram em importantes atores da guerra híbrida.

A chegada de Trump à Presidência demonstrou que a banca é forte, mas não invencível. Seu explícito interesse era a eleição de Hillary Clinton. Sobre esta derrota da banca retomaremos adiante.

O Projeto Trump, divulgado na campanha, era a reconquista do poder do Estado Nacional.  É muito importante não confundirmos o poder do Estado Nacional com o poder exercido pelo Estado em prol de um sistema ou uma ideologia.

Trump quer o “American First”, e é seu maior trunfo. O sentimento nacional é dos mais fortes impulsionadores do homem.

A competente colonização que sofremos, desde o fim da II Grande Guerra até o século atual, nos conduziram a uma zona de conforto no “American Way of Life”, com coca-cola, marlboro, calça lee, hamburger, e o valor do consumismo. Também na crença da qualidade Made in USA, sobre as demais, em especial as Feitas no Brasil.

Não cabe discutir origens nem responsabilidades. Temos um fato: os EUA desejando firmar sua soberania sobre o Brasil e, boa parte da população não sentindo, pela assimilação cultural, qualquer mudança social ou prejuízos para Soberania e para as expressões do Poder Nacional.

Mas os EUA travam esta luta com a China e com a banca.

II – O Mercantilismo Chinês

Em análise da presença chinesa na África, descontada eventual propaganda, foi mostrada uma diferença com a banca, assim entendida pelos africanos: “a China não nos cobra privatizações nem que comprar nossas empresas estatais”, ela quer comercializar seus produtos, comprar os nossos e construir vias de transporte e armazenamento para incrementar este comércio.

Assim trato o mercantilismo chinês que, no extremo, nos colocaria dependentes quer de produtos quer de tecnologias de uso. Já conhecemos esta situação, em menor escala, com produção europeia e estadunidense. O que faz diferença agora é o volume. Um verdadeiro tsunami que nos faz pensar em outro ciclo cultural, a partir de seus produtos industriais e de novos hábitos deles decorrentes.

Ambos dominadores, até agora tratados, convivem com as estruturas de Estado brasileiras e as utilizam para seus propósitos e as corrrompem, por ideologia ou simples suborno.

Diferente será a banca.

III – A Banca

A banca é dominador insidioso e malévolo. No limite pretende a destruição dos Estados Nacionais e da maior parte da humanidade.

Ela se utiliza de toda e qualquer ideia, emoção, interesse para se infiltrar e dominar tudo e todos com dois objetivos principais:

  1. a) transformar todas as rendas, sejam do trabalho, da produção, do comércio, dos alugueis em rendas financeiras. Isto é feito sobretudo com a arma da dívida, que gera, também, a escravidão;
  2. b) promover a permanente concentração de renda.

A banca ora está com socialistas (Mitterrand ou Hollande) ora com capitalistas (Chirac ou Sarközy), ora com religiosos (contra o aborto) ora com ateus (pelo casamento homoafetivo), ora com ecologistas ora pelo desmatamento, ela está e estará sempre pela destruição dos Estados Nacionais e pela redução da população mundial.

E é por essa razão que todas as guerras, sejam, como a quase totalidade, com as forças estadunidenses, sejam com outras forças europeias – inglesas, francesas, italianas – e mesmo africanas, asiáticas e latino-americanas, terão, nos respectivos países, dirigentes representantes da banca, ou seja, a banca nos governos.

E a banca pode, como é óbvio, ser republicana – os Bush – ou democrata – Obama. A conduta será igual.

Desculpem-me os que se engajaram nas campanhas de Haddad e Bolsonaro; mas, como escrevi mais de uma vez, qualquer resultado seria de candidato da banca. Visível não apenas pelos apoios de Fernando Henrique Cardoso (FHC), Joaquim Barbosa e Geraldo Alckmin mas pelas presenças de Paulo Guedes e Marcos Lisboa.

Chamo a atenção que todas as organizações financeiras internacionais – Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial (WB), Banco Central Europeu (BCE), Fórum Econômico Mundial (WEF) etc – só atuam em favor da banca.

A Banca no Brasil

O grande feito desta eleição, que comprova a articulação externa, foi o uso competente dos recursos apropriados pela banca desde os anos 1950.

Naquele tempo eram ainda novidades, surgidas na guerra e no pós-guerra, na forma de teorias, com poucas aplicações: os sistemas gerais (systems theory) e a informação (computer science). Foram com seus domínios e com o desenvolvimento destes recursos que a banca criou, ampliou e impôs, a seu proveito, a globalização e o uso da comunicação virtual, por exemplo.

Iniciemos, então, com os representantes deste interesse nos EUA, identificados, entre outros, pela Heritage Foundation, National Endowment for Democracy (NED), os Irmãos Koch e, por óbvio, o US Department of State.

No Brasil, são o Instituto Millenium (Paulo Guedes), o Instituto Liberal (Rodrigo Constantino), o Grupo de Institutos Fundações e Empresas – GIFE (Maria Alice Setubal) que os representam, formal ou ideologicamente.

Como é evidente, este grupo é constituído de vários ciclos, em diversos níveis, interligados ou não, que produzem estudos, orientações, gestão, recursos e pressões para o empoderamento e obtenção de resultados desejados pela banca.

É impossível e ingênuo imaginar um voo solo. O mundo está, para o bem ou para o mal, interconectado. A Rússia, mesmo fechada, não está isolada.

BRICS, TTIP, TPP, TISA, Aliança Atlântica, UE, UNASUL, MERCOSUL e muitas mais siglas, tratados, instituições impõem-se aos países para submetê-los e contê-los.

O Governo Bolsonaro, a exemplo do Temer, pode e talvez fique no escanteio das relações internacionais. As manifestações de pura ideologia serão bem acolhidas na medida em que ajudem à banca ou a outro poder colonial realizarem seus intentos. Mas será danoso para o Brasil e para os próprios negócios nacionais que ajudaram a formar este Governo. A notícia da mudança da Embaixada Brasileira para Jerusalém foi um alerta.

Talvez o caro leitor estranhe não ter sido tratado, até aqui, da economia, ou seja, da produção e do consumo. Mas parece que não terão espaço maior além da velha economia agrária exportadora. E, ainda assim, condicionada pelo câmbio fixado no exterior.

Há uma verdadeira olimpíada de disparates, quando as pessoas identificadas com o futuro governo falam sobre questões internacionais.

Vejamos um exemplo do poderoso superministro Paulo Guedes. Ele disse que Argentina e Mercosul “não são prioridade” para o futuro governo. Gostaria de ouvi-lo dizer na frente dos presidentes da Ford, da General Motors, da Volkswagen. Estas empresas tem acordos de repartição do mercado ao “sul do Rio Grande” e de outros consumidores menos exigentes. A Argentina fabrica alguns modelos, o Brasil outros, o México ainda outros; aproveitam as vantagens de todos os países e otimizam seus lucros. E vem um inexperiente e ignorante economista os ameaçar com esta frase! Quanto tempo durará o Ministro ou esta arrogância? E quanto custará para o Brasil?

A ser verdadeira a manifestação do futuro Ministro da Ciência e Tecnologia, divulgada nas redes sociais, a respeito do uso da Base de Alcântara, ao invés de desenvolvimento do conhecimento para soberania, o astronauta gerenciará uma administradora de imóveis, alugando (por temporada?) aquela instalação de pesquisa aeroespacial.

Conclusões e Distopias

A chegada de Ronald Reagan ao governo, em janeiro de 1981, despertou no estadunidense comum, no homem de renda e classe médias, uma esperança de se ver representado por um igual, um homem de poucas luzes. Semelhante, embora em outro contexto – a história não se repete -, ao que acontece agora com Donald Trump.

Parece-lhe que terá a voz ouvida, acima das reivindicações da extrema pobreza e das questões setoriais da sociedade e sem os recursos dos ricos e poderosos: um sonho. Os 15 segundos de glória da maioria silenciosa.

As crises, desencadeadas pela banca, trataram de eliminar as ilusões. Vieram “décadas perdidas” para o trabalho e os pequenos negócios, desempregos e  falências. A classe média se vingou votando em Bill Clinton, nos democratas.

Mas os democratas também eram da banca ….E, mais uma vez o Zé Ninguém não se fez ouvir, e repudiou a senhora Clinton, indireta e inconscientemente, a banca.

Se for possível uma comparação, diria que Collor e FHC foram os republicanos, Lula e Dilma os democratas. Bolsonaro, o Trump.

Ou estes últimos teriam revelado o gênio dos marqueteiros políticos – Steve Bannon, com sua Cambridge Analytica. Capaz de transformar o esperado tsunami azul, da eleição em novembro, em meio de mandato nos EUA, em simples marolinha, com a vitória republicana para o Senado e, provável, também no número de governadores, ficando os democratas com 51,3% da Câmara.

A esquerda brasileira foi soterrada nos escombros do Muro de Berlim. O PT jurídico, magnífica síntese político-ideológica do analista, jurista, intelectual Luiz Moreira, não mostrou consistência e coerência ideológica, nem representatividade popular, nem teve interesse em opor-se à banca, como vimos, com abundantes provas, na campanha e resultado eleitoral de 2018.

Certamente prosseguirá clamando aos ventos pela democracia e pela civilização (sic).

No Duplo Expresso, terça-feira, 06/11/2018, foi-nos mostrada a situação da geração de energia na França. Estamos diante de uma hecatombe europeia, tramada à revelia da população em um país desenvolvido e colonizador.

O Estado Nacional francês optou, com as crises do petróleo dos anos 1970, por investir na energia nuclear. Passados 40 anos, como é evidente, estaria mais do que em tempo de realizar reformas, modernizações e reestruturações. Mas, neste intervalo, o Estado Nacional foi tomado pela banca, ou seja, por privatizações, pelo Estado Mínimo e, também, pela alienação de empresas franceses para estrangeiros ou, como é atual, para os fundos de investimentos plurinacionais e trlionários.

Hoje os franceses, sem mesmo terem informações transparentes e corretas, estão às portas de apagões e explosões. Um caso para os brasileiros privatistas meditarem.

*Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado

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