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terça-feira, 16 abril, 2024

Plano Estratégico da Petrobrás prejudica o Brasil e detona o consumidor brasileiro

 por  Cláudio Oliveira*

Objetivo é dilapidar a Petrobrás

O Brasil precisa, e pode ter, uma energia mais barata do que a que pode ser obtida pela grande maioria dos países do mundo. Com forte defasagem tecnológica em relação a muitos países, precisamos de fatores que tornem nossos produtos mais competitivos. Um destes fatores, talvez o mais importante, é a energia.

Só assim teremos um crescimento (PIB) sustentável garantindo emprego e renda dentro de nossas necessidades.

Rico em recursos naturais e com duas empresas estatais de ponta na área de energia (Eletrobras e Petrobras) que podem estabelecer as bases do crescimento, fornecendo energia abundante e barata.

Ocorre que o atual governo trabalha no sentido de destruir estas duas empresas, inviabilizando quaisquer possibilidades de hoje ou no futuro, a energia no país tenha preços compatíveis com os recursos naturais disponíveis e com a tecnologia já desenvolvida. Ou seja, querem transformar o país num eterno e simples fornecedor de alimentos e matérias primas para o mundo desenvolvido. Uma eterna colônia.

Um claro exemplo é o atual plano de privatização das refinarias da Petrobras. Se concretizado vai impedir qualquer possibilidade do país vir a ter combustíveis mais baratos.

Nenhuma empresa, nacional ou estrangeira, pode produzir derivados de petróleo no Brasil a um custo mais baixo, ou mesmo perto, da Petrobras.

Segundo levantamento da ANP, num rol de 160 paises analisados, o preço dos combustíveis no Brasil está em 90º lugar, posição similar a países que não dispõe de reservas de petróleo e nem refinarias para processa-lo. Esta classificação vergonhosa é devida principalmente à política de preços que vem sendo adotada pela companhia, conhecida como Preço de Paridade de Importação (PPI). No decorrer deste artigo vou retomar este assunto.

O Plano Estratégico (PNG 2020/2024) da Petrobrás recentemente publicado confirma o que já vinha sendo indicado pelos últimos três PNG’s (2017/2021-2018/2022-2019/2023): o objetivo é dilapidar a Petrobrás.

Se nos últimos planos havia falta de transparência neste último a situação se tornou ridícula. A apresentação do plano, se assim podemos chama-lo, foi reduzida a quatro páginas.

Nos últimos planos , analisando o quadro de “Usos e Fontes”, pude demonstrar que a companhia vinha escondendo o montante da geração de caixa futura, com o claro objetivo de não informar o quanto de recursos eles pretendiam destinar aos acionistas . No PNG 2019/2023 eu estimava que este valor já alcançava a cifra de US$ 60 bilhões, conforme demonstrei no artigo a seguir:

https://www.aepet.org.br/w3/index.php/conteudo-geral/item/2520-goldman-sachs-confirma-objetivo-e-dilapidar-a-petrobras

Agora, neste PNG 2020/2024, eles resolveram o problema definitivamente e de maneira bem simples : sumiram com o quadro de Usos e Fontes. É isto mesmo que vocês leram : sumiram com o quadro de Usos e Fontes. É isto que eles chamam de transparência ? Ou seria um atestado de culpa ?

O plano atual trouxe algumas novidades. Sempre procurando utilizar termos em inglês, pois fica mais fácil de enganar aos petroleiros e aos brasileiros de modo geral.
A administração da Petrobras definiu o plano como “Mind the Gap” , pois, segundo ela “traz uma agenda transformacional, que visa eliminar o gap de performance que nos separa das melhores empresas globais de petróleo e gás, criando substancial valor para nossos acionistas”.

Lendo esta definição, um leitor dos artigos da AEPET fez o seguinte comentário :

“Não são sequer capazes de definir um nome para a estratégia que ao menos disfarce sua subserviência ao capital estrangeiro. Para quem não sabe, “Mind the Gap” é uma frase repetida continuamente (por meios eletrônicos) nas estações de metro de Londres, para alertar os usuários quanto à fresta existente entre os vagões do trem e a plataforma. Logo vejo isso como uma homenagem a quem realmente manda em nosso país”

Por outro lado, na minha opinião, existe aqui uma inversão dos fatos. Eles falam em “gap em relação as melhores empresas globais de petróleo e gás” naturalmente se referindo ás chamadas “International Oil Companies” IOC’s , empresas como Exxon, Chevron etc.

Mas estas empresas estão definhando, reduzindo suas reservas ano a ano. Não tem dívidas porque não tem projetos para investir e estão sob controle de fundos “abutres” que priorizam o rendimento imediato em detrimento do futuro da empresa. Elas não investem para sobrar mais recursos para pagar dividendos (o chamado “”caixa livre”) com o único objetivo de manter seu valor de mercado.

Para dar uma ideia segue a participação destes fundos no capital das empresas:

Participação acionária 2017 – %

     Fundo        Exxon      Chevron
   Vanguard          14,20        11,83
   Black Rock          11,51          9,59
   State Street            8,99          9,06
   Wellington            2,29          3,40
   Northern            2,36          ———-
   NYMellow            2,14          ———–
       Total          41,49        33,88

Fonte: levantamento particular Pedro Pinho

Sob influência destes fundos estas companhias são transformadas em verdadeiras empresas “zumbis”.

Na Grã-Bretanha e na Alemanha os governos criaram fundos bilionários para evitar o ataque a suas empresas. No Japão a legislação societária torna o país imune à atuação dos fundos.

No Brasil estamos totalmente vulneráveis, pois nem consciência do problema existe. Lobistas defensores destes fundos circulam com desenvoltura e liberdade, com forte penetração na mídia e no Congresso Nacional.

Detectamos a presença destes fundos na Vale e também na Petrobras, conforme artigo a seguir:

https://aepet.org.br/w3/index.php/conteudo-geral/item/2762-petrobras-fatos-relevantes-e-preocupantes

Na realidade estas empresas é que tem um “gap” em relação a Petrobras. Afinal a Petrobras além de ter descoberto as reservas do pre-sal é líder mundial em exploração e produção em aguas profundas.

Melhor seria avaliar o “gap” da Petrobras em relação a empresas como a saudita Saudi Aramco, maior petroleira do mundo, que está investindo pesado em novas refinarias e petroquímicas, para melhor aproveitar seu produto. Não leiloa suas reservas e investe perseguindo uma meta de conteúdo local de 75%.

O novo plano não fala nada sobre a política de preços considerada, o que nos leva a crer que será mantida a atual metodologia de Preço de Paridade de Importação (PPI).

A maioria dos brasileiros, inclusive petroleiros, não sabe o que isto significa. No próprio site da Petrobras temos a explicação:

Os preços para a gasolina e o diesel (agora também o GLP) vendidos às distribuidoras tem como base o preço de paridade de importação (PPI), formado pelas cotações internacionais destes produtos mais os custos que importadores teriam , como transporte e taxas portuárias, por exemplo. A paridade é necessária porque o mercado brasileiro de combustíveis é aberto á livre concorrência dando às distribuidoras a alternativa de importar os produtos. Além disso o preço considera uma margem que cobre os riscos ( como a volatilidade do cambio e dos preços)

Ou seja, o preço determinado pela Petrobras em suas refinarias (PPI) é calculado da seguinte forma:

PPI = preço no exterior + frete até o Brasil + gastos portuários + custo dos riscos

Com isto os preços dos combustíveis no Brasil ficam muito altos, permitindo que refinarias estrangeiras, principalmente americanas, coloquem seus produtos no Brasil , tomando mercado da Petrobras que fica com suas refinarias na ociosidade. A Petrobras já perdeu 30% do mercado brasileiro.

Esta politica penaliza o consumidor brasileiro, que paga preços muito mais altos do que deveria, penaliza a Petrobras que perde mercado e fica com as refinarias ociosas perdendo receita, penaliza o Brasil que fica menos competitivo.

Os únicos beneficiados são os traders internacionais e as refinarias no exterior , que ficam com os empregos, o lucro, e a renda gerada no processo. Quem mais pode estar ganhando com isto ?

A justificativa para esta politica (PPI) é de que “o mercado brasileiro é aberto à livre concorrência dando às distribuidoras a alternativa de importar os produtos”

De fato o mercado é aberto à “livre concorrência” pois o monopólio da exploração, produção e refino do petróleo foi extinto desde o governo FHC.

Quem quiser investir em produção, refino e distribuição no Brasil, pode vir que será bem recebido. Se eles tiverem tecnologia e conhecimentos para serem mais competitivos que a nossa Perobras eles terão sucesso. É assim que funciona a “livre concorrência”
Agora, a Petrobras estabelecer uma política de preços para beneficiar seus concorrentes, em detrimento de seus próprios interesses e dos interesses dos consumidores brasileiros é inaceitável. Eu diria mais : é um crime. Mas isto será tema de um próximo artigo.

A esta altura vocês já perceberam que o chamado Preço de Paridade de Importação (PPI) , termo utilizado pela Petrobras, nada mais é do que o equivalente ao Custo de Importação. Portanto:

PPI Petrobras = Custo de Importação

Ora, a Petrobras foi criada em 1953 exatamente com o objetivo de substituir as importações, garantindo o abastecimento interno a um preço mais baixo que o custo de importação. Se não, qual a razão de sua existência?

A atual política de preços visa a destruição da empresa e a submissão da população e da economia brasileira a preços escorchantes.

O custo de produção de derivados da Petrobras é muito mais baixo que o custo de importação, e é este custo de produção que tem de servir de base para o estabelecimento dos preços no mercado interno.

A POLITICA DE PREÇOS DA PETROBRAS TEM DE SER MUDADA IMEDIATAMENTE POIS CAUSA GRANDES DANOS AO BRASIL.

O novo plano estratégico introduziu também uma nova métrica: o EVA (que não foi bem explicado). O EVA veio se somar ao EBITDA, ambos siglas em inglês, feitos para confundir o entendimento de leigos.

São estabelecidos arbritáriamente e se utilizados em empresas em processo de grandes investimentos podem conduzir a enormes erros de interpretação.

Servem para induzir à venda de ativos para redução de dividas gerando maiores disponibilidades para distribuição imediata de dividendos. Por falta de consenso no cálculo destes indicadores eles não são padronizados e não comparáveis entre empresas. As grandes petroleiras mundiais não apresentam estes indicadores em suas publicações oficiais.

Melhor seria se fossem estabelecidas métricas mais claras, objetivas, e de fácil entendimento.

Muitos devem se lembrar, e não faz muito tempo, de quando no Brasil, o preço de um litro de gasolina era igual ao preço de um litro de leite. Fica a sugestão de métrica para a Petrobrás:

PREÇO DO LITRO DE GASOLINA = PREÇO DO LITRO DE LEITE

É claro que outros atores teriam de ser envolvidos, mas a participação da Petrobras é preponderante. Aspectos como carga tributária e existência de carteis seriam discutidos e resolvidos paralelamente.

*Claudio da Costa Oliveira
Economista da Petrobras aposentado

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